Os negócios de impacto e a agenda do meio ambiente
* Por Rachel Avellar Sotomaior Karam
Na primeira semana pós-eleições, o presidente eleito Jair Bolsonaro anunciou que uniria sob um único ministério as pastas do Meio Ambiente e da Agricultura. A proposta foi recebida com críticas por especialistas e manifestações contrárias das organizações de defesa do meio ambiente. O governo eleito, aparentemente, recuou.
Enquanto paira dúvida sobre o formato da administração executiva federal nessa frente, a discussão é oportuna e merece também uma análise jurídico-econômica sob a ótica dos negócios de impacto. A Constituição Federal foi pioneira ao estabelecer no capítulo dedicado ao Meio Ambiente o direito do cidadão ao ecossistema ecologicamente equilibrado, impondo ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
A lógica desenvolvida até hoje em normas, doutrina e jurisprudência se deu sob o ângulo do dano ambiental (potencial ou realizado) decorrente da atividade produtiva ou extrativista, e a partir disso, meios de avaliar, mitigar, prevenir o risco e indenizar o prejuízo sofrido, além de punir os responsáveis. E esses investimentos para a solução de problemas sociais e ambientais foram, historicamente, conferidos à administração pública ou à filantropia, com pouco ou nenhum envolvimento da iniciativa privada.
Na última década, no entanto, surgiu um segmento da nova economia no qual os negócios agregam a seus produtos e serviços soluções para os mais diversos desafios socioambientais. A empresa passa a utilizar as ferramentas que possui não apenas para evitar o dano ambiental potencial, mas também para promover um benefício real àqueles envolvidos em sua cadeia de valor, os recursos naturais empregados e o ambiente à sua volta.
Os negócios de impacto, via de regra, desenvolvem um mercado a partir de uma necessidade existente. As políticas ambientais são catalisadoras do surgimento e da escala desses empreendimentos, inclusive nos campos da agricultura – pelas agritechs, por exemplo – e da economia regenerativa.
Vê-se um crescimento em todo o mundo, e também no Brasil, de empresas que integram o propósito de gerar um impacto socioambiental positivo por meio de suas atividades lucrativas, utilizando métodos verificáveis para mensurar o impacto das suas atividades e dando transparência a esses dados aos seus clientes e investidores. É uma mudança significativa de perspectiva, com o sucesso sendo medido não apenas pelo êxito econômico, mas também pelo impacto positivo gerado na atividade – agregando este novo valor à companhia.
A adoção do impacto positivo ao modelo de negócio atende ao chamado constitucional de preservação coletiva do equilíbrio do ecossistema do planeta e aumenta a chance de alcance do benefício para as futuras gerações, pois repercute na perenidade do próprio negócio.
É fato que a pauta do Meio Ambiente é mais ampla que a da Agricultura e a intersecção existente entre elas não seria suficiente para justificar a fusão proposta. As políticas do governo federal para o meio ambiente muitas vezes servem de suporte para a realização efetiva dos impactos positivos buscados pelos negócios, e misturá-las aos legítimos interesses do estímulo à agropecuária nacional, bem como à regulação do setor, pode afetar negativamente todo um novo e promissor segmento econômico.
* Rachel Avellar Sotomaior Karam é advogada, sócia do escritório TESK Advogados e coordenadora do Grupo Jurídico B, do Sistema B.